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quinta-feira, 14 de junho de 2007

Todo Mundo e Ninguém

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(Auto da Lusitânia, de Gil Vicente)

Todo o Mundo e Ninguém

Um rico mercador, chamado "Todo o Mundo" e um homem pobre cujo nome é "Ninguém", encontram-se e põem-se a conversar sobre o que desejam neste mundo. Em torno desta conversa, dois demônios (Belzebu e Dinato) tecem comentários espirituosos, fazem trocadilhos, procurando evidenciar temas ligados à verdade, à cobiça, à vaidade, à virtude e à honra dos homens. Representada pela primeira vez em 1532, como parte de uma peça maior, chamada Auto da Lusitânia (no século XVI, chama-se auto ao drama ou comédia teatral), a obra é de autoria do criador do teatro português, Gil Vicente.

Entra Todo o Mundo, rico mercador, e faz que anda buscando alguma cousa que perdeu; e logo após, um homem, vestido como pobre. Este se chama Ninguém.
Ninguém: Tu estás a fim de quê ?
Todo Mundo: A fim de coisas buscar que não consigo topar. Mas não desisto, porque o cara tem de teimar.
Ninguém: Me diz teu nome primeiro.
Todo Mundo: Eu me chamo Todo Mundo e passo o dia e o ano inteiro correndo atrás de dinheiro, seja limpo ou seja imundo.
Belzebu: Vale a pena dar ciência e anotar isto bem, por ser fato verdadeiro: Que Ninguém tem consciência e Todo Mundo, dinheiro.
Ninguém: E o que mais procuras, hem?
Todo Mundo: Procuro poder e glória.
Ninguém: Eu cá não vou nessa história. Só quero virtude... Amém.
Belzebu: Mas o pai não se ilude e traça: Livro Segundo. Busca o poder Todo Mundo e Ninguém busca virtude.
Ninguém: Que desejas mais, sabido?
Todo Mundo: Minha ação elogiada. Em todo e qualquer sentido.
Ninguém: Prefiro ser repreendido quando der uma mancada.
Belzebu: Aqui deixo por escrito o que querem, lado a lado: Todo Mundo ser louvado e Ninguém levar um pito.
Ninguém: E que mais, amigo meu?
Todo Mundo: Mais a vida. A vida, olé!
Ninguém: A vida? Não sei o que é. A morte, conheço eu.
Belzebu: Esta agora é muito forte e guardo para ser lida: Todo Mundo busca a vida e Ninguém conhece a morte.
Todo Mundo: Também quero o Paraíso, mas sem ter que me chatear.
Ninguém: E eu, suando pra pagar minhas faltas de juízo!
Belzebu: Para que sirva de aviso, mais uma transa se escreve: Todo Mundo quer Paraíso e Ninguém paga o que deve.
Todo Mundo: Eu sou vidrado em tapear, e mentir nasceu comigo.
Ninguém: A verdade eu sempre digo sem nunca chantagear.
Belzebu: Boto anúncio na cidade, deste troço curioso: Todo Mundo é mentiroso e Ninguém fala a verdade.
Ninguém: Que mais, bicho?
Todo Mundo: Bajular
Ninguém: Eu cá não jogo confete.
Belzebu: Três mais quatro igual a sete. O programa sai do ar. Lero lero lero lero, curro paco paco paco. Todo Mundo é puxa-saco e Ninguém quer ser sincero!

A net é um pouco assim pra mim. Você está conectado a Todo Mundo mas não está ligado a Ninguém. Nas raras vezes em que o virtual se transforma em real, pode acontecer uma amizade ou um relacionamento digno de nota... mas é raro. Acho que é por isso mesmo que, após um tempo navegando você percebe que está cada vez mais sozinho. É tenho ns pensamentos assim, um pouco dreprês de vez em quando. O acesso ao MUNDO não lhe acesso às PESSOAS de verdade. E isso é realmetne frustrante. Aqui, neste mundo virtual, TODO MUNDO busca algo. NINGUÉM encontra realmente. Hora errada, busca errada, espectativa errada? Não, nada disso. LUGAR ERRADO. Tudo o que buscamos aqui na net pode estar bem debaixo do nosso nariz mas, ocupados que estamos com nossos "contatos" virtuais, nossos blogs, flogs, orkuts e messengers, não conseguimos ver. E eu, que estou aqui desembuchando tudo isso, aqui, no meu blog, na net, para meus contatos, meus amigos virtuais, meus leitores insanos ou insones, estou buscando o que?

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